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Ninguém pode com ele na época atual. Nada nem ninguém é páreo para a sua sagacidade, sua esperteza e sua astúcia. Pois tudo ele sabe sempre melhor, e o que eventualmente não sabe trata logo de encobrir com um manto de aparente sabedoria, de modo que seu poder e influência permanecem intocados. Para tudo ele encontra explicações eloquentes, argumentos convincentes, justificativas persuasivas.
Estamos falando do raciocínio humano. Dele, que se arrogou a “sabe-tudo” em assuntos que não lhe dizem respeito, e que com isso estrangulou a voz do espírito, a intuição (http://on.fb.me/1It3JZy). Ele, o Caim que matou Abel. Mesmo quando, aqui e ali, o espírito-Abel ainda consegue se mostrar presente mediante um sussurro quase inaudível da intuição, o raciocínio-Caim intervém imediatamente, de modo a fazer valer unicamente a sua opinião, que nunca pode se estender além do restrito ambiente material, haja vista que ele próprio se originou da matéria, embora justamente cultive o hábito de intitular-se “presença de espírito”.
O escritor Rubem Alves narra uma curiosa história que ilustra bem a sagacidade do raciocínio*: Havia numa cidadezinha dos Estados Unidos uma comunidade protestante muito conservadora e muito rigorosa em relação a princípios éticos. Nessa mesma localidade havia também uma fábrica de cerveja, que para aquela igreja era a vanguarda de Satanás, sendo tratada correspondentemente no púlpito. Certo dia, a fábrica de cerveja manifestou a intenção de doar 500 mil dólares para a Igreja. De início, os membros foram categóricos em denunciar o dinheiro como obra do demônio, que não poderia de maneira alguma ser aceito. Contudo, passada a excitação dos primeiros dias, algumas vozes começaram a se levantar em favor de uma possível aceitação, sob determinadas condições. Depois de muita discussão, registrou-se a seguinte decisão no livro de atas: “A Igreja ……… resolve aceitar a oferta de 500 mil dólares feita pela Cervejaria ……… na firme convicção de que o diabo ficará furioso ao ver seu dinheiro sendo usado para a glória do Senhor” (!).
A singular decisão da comunidade americana caracteriza, na realidade, uma capitulação disfarçada de boa intenção. Percebemos isso claramente porque estamos de fora. Mas a mesma coisa acontece conosco quando precisamos tomar alguma decisão importante. Não notamos a similaridade da situação porque estamos “de dentro”, sob o domínio do astuto Caim, sem pressenti-lo. Mesmo quando a intuição ainda consegue nos exortar a agir de uma determinada maneira, frequentemente nos deixamos levar pelas argumentações de Caim e escolhemos outra, errada, da qual mais tarde nos arrependemos irremediável e amargamente.
A única maneira de arrancar Caim do trono usurpado e destituí-lo do seu domínio é fortalecer a intuição, pela qual o espírito se faz valer (http://on.fb.me/1OWeht1). Porém, isso só acontecerá se direcionarmos nossa vontade exclusivamente no sentido do bem, sem reservas. Somente assim Abel, o verdadeiro sábio, poderá reviver e retomar o lugar que lhe compete. E somente assim a evolução espiritual poderá prosseguir, depois de ter permanecido estagnada e até retrocedido por milênios.
[*Registrado em “Ostra feliz não faz pérola”, de Rubem Alves.]
(Conheça as obras publicadas pela Ordem do Graal na Terra. Acesse: http://bit.ly/18h6hxk.)